Um ano após operação de desintrusão, crise humanitária persiste na Terra Indígena Yanomami

16 janeiro 2024

Foto tirada em 5 de janeiro de 2024. A criança é da comunidade de Hokomau. Ela foi atendida no posto de saúde de Surucucu. © Urihi

A grave crise humanitária ainda ameaça vidas indígenas no território Yanomami, mesmo um ano após o começo da operação governamental para retirar os garimpeiros ilegais da terra indígena.

A Terra Indígena Yanomami é a maior Terra Indígena do país. Ela está localizada nos estados de Roraima e Amazonas e é morada de cerca de 30 mil Yanomami, Ye’kwana e indígenas isolados.

Dados da Sesai (Secretaria de Saúde Indígena) mostram:

  • Os casos de malária aumentaram 61% em 2023, com pelo menos 25 mil casos;
  • Os casos de síndrome gripal aumentaram exponencialmente: de 3203 em 2022 para 20524 em 2023. Um aumento de 640%;
  • Foram 308 mortes de indígenas (contabilizadas de janeiro a novembro de 2023), a maioria de crianças de até 5 anos.

Recentemente a Corte Interamericana de Direitos Humanos publicou um relatório em que detalha o quanto a situação piorou no território:

  • Os estabelecimentos de saúde dentro do território indígena estão completamente deteriorados. Nove Unidades Básicas de Saúde Indígena da Terra Indígena Yanomami (sendo elas Hakoma, Homoxi, Kayanau (Paapiu), Parafuri, Parima Kiola, Haxiu, Ajarani e Alto Catrimani) ainda estão completamente fechadas;
  • O acesso à água potável é quase inexistente;
  • Muitos garimpos ilegais continuam ativos.

O relatório também destacou que a continuidade da situação de extrema gravidade implica “danos irreparáveis à vida, à integridade pessoal e à saúde dos povos indígenas”. Observou ainda que “existem grupos de garimpeiros armados que fazem parte de facções do crime organizado e permanecem na Terra Indígena Yanomami, distribuindo armas à população indígena.”

Fotos e vídeos recentes revelam como a desnutrição ainda afeta crianças e adultos Yanomami, bem como a ação de garimpeiros ilegais que ainda operam na área com impunidade.

Em um incidente particularmente chocante capturado em vídeo, três jovens Yanomami foram amarrados em postes e detidos por garimpeiros.

Dario Kopenawa Yanomami, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami, disse: “Mesmo com o decreto de emergência, o governo não conseguiu resolver a situação. Os garimpeiros continuam na terra Yanomami. E hoje o garimpo é mais pesado do que na década de 80 e 90. Hoje existe um garimpo que são de facções, do crime organizado, do PCC e do Comando Vermelho na terra Yanomami. Essa é uma situação muito, muito grave, uma situação muito vulnerável para os Yanomami. As crianças continuam morrendo de malária, as crianças morrendo de pneumonia, as crianças morrendo de verme, de tuberculose. A terra Yanomami ainda vive uma situação de crise humanitária. E nós vamos continuar a lutar e continuar criticando o governo federal e estadual.”

Fiona Watson, Diretora de Pesquisa e Campanhas da Survival International, disse hoje: “Apesar das promessas do presidente Lula quando, há um ano, anunciou a operação para retirar os garimpeiros, a situação atual na Terra Indígena Yanomami é catastrófica. Os garimpeiros voltaram ao território e antigos garimpos voltaram à ativa. As Forças Armadas, que estão envolvidas na operação para retirá-los, não estão atuando de forma contundente. Muitos postos e serviços de saúde vitais não estão funcionando.”

“A situação dos milhares de Yanomami que vivem no lado venezuelano da fronteira também é crítica e quase não recebe atenção da imprensa. Os garimpeiros estão trabalhando em novas áreas na Venezuela com o apoio dos militares venezuelanos. Atualmente há uma epidemia de malária e muitos Yanomami morreram.”

“A situação dos indígenas isolados Yanomami é especialmente preocupante – sabemos que os garimpeiros ainda operam a poucos quilômetros das suas comunidades.”

“Se isso continuar, mais centenas de Yanomami morrerão e suas terras se tornarão inabitáveis. É absolutamente vital que as novas medidas anunciadas pelo presidente Lula sejam colocadas em prática imediatamente, como parte de uma operação contínua e abrangente para remover permanentemente os garimpeiros e fornecer os cuidados de saúde intensivos que são tão necessários. Também é vital que a operação seja mantida – caso contrário, esta história irá se repetir até que os Yanomami sejam dizimados. Já passou da hora de levar à justiça, para que paguem pelos seus crimes, todos aqueles que lucram com o garimpo ilegal.”

Nota aos editores:

1- As estatísticas citadas neste comunicado de imprensa representam uma subestimação da verdadeira situação, uma vez que, para a sua própria segurança, as equipes de saúde não estão visitando as áreas mais remotas do território onde os garimpos continuam ativos.

2 - O PCC (Primeiro Comando da Capital) e o Comando Vermelho são as maiores organizações do crime organizado no Brasil.

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