Denúncia da Survival à OCDE: Fornecedor de couro da BMW e Jaguar Land Rover vinculado a destruição da floresta de indígenas isolados
13 dezembro 2022
As empresas que fornecem couro para a Jaguar Land Rover e BMW estão ligadas ao desmatamento ilegal no território de um dos povos indígenas isolados mais ameaçados do mundo, de acordo com uma denúncia oficial enviada hoje pela Survival International à OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Duas empresas italianas, Pasubio e Gruppo Mastrotto, compram couro fornecido por fazendas de gado que ocupam e desmatam ilegalmente a terra dos indígenas isolados Ayoreo do Paraguai. Esses Ayoreo são os últimos indígenas isolados na América do Sul fora da Amazônia. As fazendas que ocupam seu território ameaçam sua existência.
Jaguar Land Rover e BMW e outras companhias utilizam o couro vendido pelas duas empresas italianas no interior dos carros que reveste assentos, volantes e outros.
Esta correlação está no centro de uma denúncia formal apresentada hoje pela Survival International à OCDE, em acordo com indígenas Ayoreo contatados. A denúncia, contra a empresa Pasubio, foi enviada ao ‘Ponto de Contato Nacional’ (NCP) da Itália para a OCDE.
Algumas semanas atrás, a Survival enviou cartas a ambas as empresas italianas pedindo o fim dessas importações. O Gruppo Mastrotto respondeu iniciando um diálogo com a Survival, que ainda está em andamento, mas a Pasubio enviou apenas uma resposta genérica e superficial. A Survival, portanto, em acordo com indígenas Ayoreo contatados, apresentou uma denúncia formal contra a Pasubio de acordo com as Diretrizes da OCDE para empresas multinacionais.
A ligação entre o couro usado na indústria automobilística e a destruição ilegal da floresta dos Ayoreo foi revelada pela primeira vez em uma investigação da Earthsight. Em duas reportagens, Grand Theft Chaco I e Grand Theft Chaco II, a organização revelou que quase dois terços do couro exportado do Paraguai vão para empresas italianas, principalmente a Pasubio. 90% do lucro anual da Pasubio, de 313 milhões de euros, vem da indústria automobilística.
A denúncia afirma que a Pasubio parece ter violado vários princípios das Diretrizes da OCDE, incluindo os de Divulgação de Informações (III), Direitos Humanos (IV), Meio Ambiente (VI) e Interesses do Consumidor (VIII) e exige que a empresa pare de importar couro de fornecedores do Paraguai que sejam responsáveis e/ou estejam envolvidos no desmatamento da floresta dos Ayoreo.
Tagüide Picanerai, indígena Ayoreo Totobiegosode, disse hoje: "O efeito negativo que a produção de carne e couro tem é o desmatamento e como isso afeta a população local (…). O couro é como uma parte não visível da pecuária, que não é levada em consideração porque só se vê a carne, mas afeta muito a população local. Quem cria o gado e quem exporta e vende lá na Europa se beneficia, mas aqui produz desmatamento e o povo Ayoreo sofre.”
A coordenadora da campanha da Survival pela proteção das terras dos Ayoreo, Teresa Mayo, disse hoje: “O governo paraguaio entregou a maior parte do território ancestral dos Ayoreo para empresas do agronegócio que estão desmatando ferozmente a floresta: primeiro eles cortam as madeiras nobres, depois ateiam fogo, e finalmente introduzem o gado na terra desmatada. Os Ayoreo estão testemunhando a destruição de seus meios de subsistência, de sua saúde física e mental e de suas vidas. Mas eles continuam determinados a resistir, ao lado de seus parentes isolados, que são forçados a viver fugindo das escavadeiras que estão destruindo sua floresta."
Francesca Casella, diretora da Survival Itália, disse hoje: “Prevê-se que a demanda por couro automotivo aumente mais de 5% ao ano até 2027. Clientes e consumidores finais precisam estar cientes disso e, como a Itália é o maior comprador mundial do couro paraguaio, tem o poder e a responsabilidade de intervir, parando de fazer negócios com fazendas de gado que operam ilegalmente em terras indígenas com a conivência de políticos e funcionários corruptos.”
Notas aos Editores:
- Existem mais de 5.000 indígenas Ayoreo vivendo no Paraguai e na Bolívia. O subgrupo conhecido como Ayoreo-Totobiegosode é foco da denúncia formal da Survival. A maioria dos Ayoreo-Totobiegosode são contatados e vivem em aldeias no Paraguai, mas alguns vivem em isolamento.
- Os Ayoreo Totobiegosode lutam pelo retorno de suas terras ancestrais desde 1993, quando apresentaram uma reivindicação formal ao governo paraguaio.
- Em 2001, o governo do Paraguai reconheceu formalmente um território de 550.000 hectares na província do Alto Paraguai como ’Patrimônio Natural e Cultural dos Ayoreo Totobiegosode’ (PNCAT). No entanto, até agora as autoridades só transferiram parte dos títulos de posse de terra para os Ayoreo. Com isso continuam descumprindo tanto a liminar expedida pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) sobre o território (que exige que o Paraguai proteja e salvaguarde o PNCAT e os grupos isolados que lá vivem, impedindo a entrada de terceiros e contatos indesejados); e as resoluções emitidas em 2018 pelo Instituto Nacional de Florestas (INFONA), que proíbem o desmatamento dentro da área.
- A carne e o couro do Paraguai são responsáveis, se comparados por peso, por mais desmatamento do que qualquer outra matéria-prima do planeta (Grand Theft Chaco I, p. 36).
- O Chaco do Paraguai, onde vivem os Ayoreo, é uma das florestas que está sendo mais rapidamente desmatada do mundo..
- Algumas das respostas das companhias automobilísticas à investigação original da Earthsight estão listadas aqui.